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Evidências científicas e epistemicídio no âmbito das perícias contábeis

Tendo como referente uma possível existência de ato de negativismo, em relação às evidências científicas contábeis, por parte de um perito, quando do exame das provas, apresentamos uma resumida análise sobre o surgimento da categoria

Tendo como referente uma possível existência de ato de negativismo, em relação às evidências científicas contábeis, por parte de um perito, quando do exame das provas, apresentamos uma resumida análise sobre o surgimento da categoria: “epistemicídio contábil”, como uma explicação aos labores periciais inconclusivos ou deficientes tipificados no §5° do art. 464 do CPC/2015.

Inicialmente cabe esclarecer, à luz da doutrina[1], o conceito de perícia inconclusiva, distinguindo a da perícia deficiente, como segue:

PERÍCIA INCONCLUSIVA OU DEFICIENTEo exame técnico-científico pericial visa fornecer melhores elementos para o juízo formar o seu livre convencimento, devendo por isso, ser realizada por profissional dotado de conhecimento técnico e científico específico na matéria ou assunto sobre o qual é chamado a opinar. E quando o laudo pericial se revela inconclusivo ou deficiente em suas conclusões, ou seja, pela falta de critérios objetivos para a aferição, o que conflitam com a prova documental encartada nos autos, pode o julgador determinar a realização de segunda perícia. Isto ocorre quando um ou ambos os litigantes apresentarem impugnação ao laudo pericial destacando precisamente incongruências no momento oportuno, esta impugnação ou objeção ao laudo do perito oficial deverá ser feita por perito assistente especializado na matéria, que demonstre de forma inequívoca as incoerências ou equívocos do laudo do perito oficial. É público e notório que a prova ou exame pericial é essencial ao deslinde de uma controvérsia, sendo que sua falta ou a sua realização de forma inconclusiva ou deficiente acarreta a impossibilidade de uma sentença justa. Se um laudo não foi capaz de esclarecer com exatidão técnica ou científica a questão trazida em juízo, diz que foi inclusiva, ou se foi feito com ausência ou a disfunção de uma estrutura técnica científica ou que tenha sido apresentado com patologias, diz-se deficiente. Deficiência é o termo usado para definir a ausência ou a disfunção de uma estrutura técnica científica e diz respeito à atividade exercida pelo perito, de uma forma mais restrita, refere-se à ausência de conhecimento do perito, logo, é um laudo que não é suficiente sob o ponto de vista quantitativo e qualificativo; por ser deficitário ou incompleto. A falta de documentos ou provas entranhadas aos autos, não caracteriza que a perícia foi inconclusiva ou deficiente, e sim, que a parte que tinha o ônus da prova, não o fez, pois ao perito cabe inspecionar as provas produzidas pelos litigantes e não produzir provas, logo, alegações ou impugnações de forma genérica, sem a demonstração exata dos pontos pelos quais o laudo se fez omisso, contraditório, obscuro, inconclusivo ou deficiente, não configuram validade para o afastamento do perito e devolução dos honorários e nomeação de um segundo perito. Uma dúvida razoável em relação a um laudo pericial, configura uma perícia inconclusiva ou deficiente. Uma opinião pericial com uma visão pericial anacrônica é um laudo deficiente. A falta de asseguração contábil indica deficiência. Já uma interpretação equivocada de evidência em perícia configura um laudo inconclusivo, por ser diverso da verdade científica. Os inconclusos ou deficiências podem ser supridas por esclarecimento do perito. Um laudo pode ser considerado bom pelo viés técnico-científico quando for constituído somente por afirmações verificáveis e o contrapolo, ou seja, refutabilidade são os laudos inconclusivos ou deficientes.

Esclarecido a questão do que é uma perícia inconclusiva ou deficiente, vamos refletir sobre a questão do epistemicídio contábil, como uma explicação lógica para a negação da verdade.

O epistemicídio representa a destruição, a morte ou a negação dos conhecimentos contábeis por uma influência estranha e profana à ciência clássica, inclusive a negação de provas que podem caracterizar uma evidência. O processo de matar ou deturpar o conhecimento científico contábil é conhecido como epistemicídio que também é uma das formas mais perversas de aniquilamento de conhecimento científico, sendo fruto da ignorância de alegações e/ou justificativas genéricas. Como exemplo, temos que negar a existência do fundo de comércio autodesenvolvido com a necessidade do registro do seu preço como um bem intangível, configura epistemicídio contábil, pois tal fato, negação vazia da existência do fundo de comércio, é proveniente de uma herança de marginalização e distanciamento das formas de conhecimento pautadas na verdade real, como tambem, é epistemicídio uma precificação do fundo de comércio pela via do fluxo de caixa descontado. Epistemicídio contábil é uma forma aética de silenciar, desvalorizar ou aniquilar a Ciência, pois não existe dúvida razoável que o epistemicídio acontece quando surgem danos epistêmicos. O termo epistemicídio tem muitas aplicações, pois pode ser usada para explicar a falta de conhecimento em diversos ramos das Ciências, pois em sua acepção primária[2]: “indica um processo de invisibilização e ocultação das contribuições culturais e sociais não assimiladas pelo 'saber' (...)”. Consta-se que existe o epistemicídio contábil, pela manutenção da cultura do negativismo lastreada em ideologias influentes, pois é necessário a um perito exercer uma reflexão sobre a essência de atos e fatos patrimoniais e teorias contábeis, como o neopatrimonialismo, a Teoria Pura da Contabilidade e suas teorias auxiliares, entre outras teorias, princípios e axiomas constantes da literatura, na valoração dos elementos probantes, sem desconsiderar posições contrárias, pois é de vital importância um juízo de ponderações.

A nossa assertividade tem o propósito eminentemente filosófico, de provocar um pensamento crítico, em relação ao fabrico de um laudo. Lembrando que uma crítica, não é falar/pensar bem ou mal, e sim, “refletir” pensando sobre a verdade prática deste fenômeno do epistemicídio contábil.

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.

HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil - da Retaguarda à Vanguarda - Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e Ampliada. 11. ed. Curitiba: Juruá, 2020. 691 p.

SAVARIS, Leonardo. Epistemicídio e o apagamento estrutural do conhecimento africano. Jornal da Universidade. Disponível em: <https://www.ufrgs.br/jornal/epistemicidio-e-o-apagamento-estrutural-do-conhecimento-africano/#:~:text=Epistemic%C3%ADdio%20%C3%A9%20um%20termo%20criado,assimiladas%20pelo%20'saber'%20ocidental>. Acesso em 21 set. de 2022.

As reflexões contabilísticas servem de guia referencial para a criação de conceitos, teorias e valores científicos. É o ato ou efeito do espírito de um cientista filósofo de refletir sobre o conhecimento, coisas, atos e fatos, fenômenos, representações, ideias, paradigmas, paradoxos, paralogismos, sofismas, falácias, petições de princípios e hipóteses análogas.


[1] HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil - da Retaguarda à Vanguarda - Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e Ampliada. 11. ed. Curitiba: Juruá, 2020, p. 341.

[2] Pressupõem-se que o termo “epistemicídio” foi criado pelo sociólogo e estudioso das epistemologias do Sul Global, Boaventura de Sousa Santos, que e nasceu em 1940 e atuou como Professor Catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Disponível em: <https://www.ufrgs.br/jornal/epistemicidio-e-o-apagamento-estrutural-do-conhecimento-africano/#:~:text=Epistemic%C3%ADdio%20%C3%A9%20um%20termo%20criado,assimiladas%20pelo%20'saber'%20ocidental>. Acesso em 05 set de 2022.

[1] Wilson A. Zappa Hoog é sócio do Laboratório de Perícia Forense Arbitral Zappa Hoog & Petrenco, perito em contabilidade e mestre em direito, pesquisador, doutrinador, epistemólogo, com 48 livros publicados, sendo que alguns dos livros já atingiram a marca de 11 e de 17 edições.

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